Primeira parte do post sobre prescrição de exercício e câncer mostra a realidade da doença e dos pacientes. Acompanhe:
Olá,
Tudo bom?
A prescrição de exercício e o câncer é o tema do nosso post de hoje.
Este é um assunto muito importante, afinal de contas, o câncer segue como uma das maiores causas de mortes no Brasil e no mundo. Uma doença que em alguns aspectos ainda é misteriosa para a ciência, mas que, com os devidos cuidados, tem grandes chances de ser revertida.
Como o assunto é extenso, proponho de a gente dividir o tema em dois posts, assim nossa conversa flui melhor, combinado?
Nesta primeira publicação, nós vamos falar basicamente da fisiopatologia, dados epidemiológicos, causas, efeitos da doença em nosso organismo e algumas outras informações importantes. A minha intenção é mostrar, além da relação entre a prescrição de exercício e o câncer, como o trabalho do profissional de educação física pode contribuir, e muito, para a prevenção e também para o tratamento dos pacientes, mas…
Por que falar sobre câncer e exercício físico?
Esse é um tema que a Ciência vem discutindo e mostrando ótimos resultados, porém, por incrível que pareça, muitos estudantes da área da Saúde nunca leram, assistiram uma aula ou participaram de algum curso que traga o exercício físico como algo importante durante o tratamento do câncer.
Infelizmente, para nós, educadores físicos, ainda não é uma realidade ter contato com essa população, Durante a graduação, só entramos em clínicas e hospitais se buscarmos fora das grades curriculares. O que, na minha opinião, é uma pena. Aliás, está aí uma excelente área para atuação no mercado profissional e também na pesquisa. Se você nunca pensou no assunto, acho que está na hora de considerar.
No meu caso, a primeira vez que tive acesso a esse conhecimento foi quando cursei uma disciplina do mestrado chamada “Inovações tecnológicas em Atividade Física Adaptada” na Universidade de Genebra (Suíça) em 2009. Lá, tive a oportunidade de conhecer o professor Hiromitsu Takahashi que, além de dar aula no mestrado, era uns dos chefes do serviço de Oncologia do Hospital Cantonal de Genebra.
Confesso que até aquele dia eu nunca havia estudado, ouvido ou lido sobre qual a verdadeira relação entre a prescrição de exercício e o câncer, onde o exercício pode ajudar e, principalmente, como esse trabalho deve ser feito.
Talvez você esteja se perguntando: ok, mas por que o Raphael escolheu trazer esse assunto neste post?
Bom, há duas semanas, no Blog Ciência inForma, a professora e colunista Fabiana Benatti apresentou um estudo recente que em seu post que tinha o seguinte título: “Exercício físico (aeróbio): um forte aliado na luta contra o câncer.” Nesse post ela descreve e desvenda o que esse novo estudo trouxe de resultado, como podem conferir nesse trecho: “Mas um artigo publicado recentemente na renomada revista científica Cell Metabolism traz evidências (impressionantes) de que o exercício aeróbio pode não apenas prevenir, mas também combater o câncer. Portanto, além da prevenção, o exercício pode ser um aliado ao tratamento. Nesse estudo, ratos foram inoculados com diferentes tipos de células cancerígenas e aqueles que se exercitavam apresentaram incidência e crescimento de tumores ate 60% menores quando comparados aos que não se exercitavam.”
A professora nos explica vários pontos, mas há um que chamou muito a minha atenção: o controle dos exercícios. No estudo em questão é sugerido que os exercícios devem ser intensos e de longa duração. E foi exatamente nesse ponto que resolvi abrir meu material do mestrado que contém as aulas sobre câncer e comecei a reestudar tudo para ver se, já naquela época, nós havíamos começado a ver alguns indícios desses resultados. Pois bem, não havia nada no material que indicasse esse caminho, entretanto, consegui relembrar muitas informações valiosas que vou compartilhar com você nesse post.
Como meus alunos bem sabem, gosto de discutir primeiro a fisiopatologia em questão para entender melhor o que devo controlar durante a recomendação do treino e, em nossa conversa de hoje, sobre a prescrição de exercício e o câncer, não será diferente. Vamos lá?
A primeira pergunta é a mais básica e uma das mais importantes de todo o processo:
O que é câncer?
Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), câncer é o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenças que têm em comum o crescimento desordenado de células que invadem os tecidos e órgãos, podendo espalhar-se para outras regiões do corpo.
Dividindo-se rapidamente, estas células tendem a ser muito agressivas e incontroláveis, determinando a formação de tumores (acúmulo de células cancerosas), também chamados de neoplasias malignas. Por outro lado, um tumor benigno significa simplesmente uma massa localizada de células que se multiplicam vagarosamente e se assemelham ao seu tecido original, raramente constituindo um risco de vida.
Outras características que diferenciam os diversos tipos de câncer entre si são a velocidade de multiplicação das células e a capacidade de invadir tecidos e órgãos vizinhos ou distantes por meio de metástases.
Metástase é basicamente quando as células cancerígenas desprendem do tumor e entram na corrente sanguínea ou no sistema linfático. Assim, essas células podem se ligar a um outro órgão e iniciar um novo processo de formação de outro câncer; esse novo tumor é chamado de metastático ou secundário.
Por exemplo: uma paciente diagnosticada com câncer de mama que algum tempo depois descobre um novo câncer, mas de pulmão, tem um câncer metastático. O câncer de pulmão é constituído por células cancerosas da mama e não de células pulmonares. Nesse caso, ao analisar as células da doença (câncer de pulmão) é possível perceber que as células do câncer metastático são parecidas com as células do órgão no qual a doença começou. Assim, nesse exemplo, a paciente deverá procurar um especialista em mama e não um oncologista especializado em pulmão.
Como surge o câncer?
Nossas células são programadas para viver um certo tempo, e em ciclo normal, acontece da seguinte forma: a célula nasce, se divide, dando origem a outras células de mesma função que também podem continuar se dividindo de forma controlada. Após um período, que pode variar de dias até muitos anos, essa célula morre, e essa morte celular é chamada de apoptose.
O responsável pelo controle da vida da célula é o DNA, é ele que determina a velocidade de divisão, a função, o tempo de vida, etc. Em alguns casos pode ocorrer uma mutação no gene da célula, esta nova célula modificada não vai agir em conjunto, nem respeitar o ciclo de vida das células normais. É aí que surge o problema: essa célula não vai sofrer apoptose e sua velocidade de dar origem a outras células é muito maior que as células sadias, sendo assim, elas se proliferam de forma incontrolada e podem causar sérios problemas no organismo.
Alguns fatores de mutação:
- Hereditária:
- Fatores de mutação – Certas variedades de câncer de mama e de cólon;
- Cânceres familiares (10% dos cânceres humanos) estão associadas com uma alteração constitucional de um gene.
- Viral:
- O câncer de fígado associada à hepatite B, o sarcoma de Kaposi ou HIV e câncer do útero ou papilomavírus (HPV) são exemplos de vírus que podem desencadear um câncer.
- Imunidade:
- Com o HIV, o sistema imunológico torna-se incapaz de reconhecer antígenos anormais de células cancerosas e destruí-los.
- Alimentação:
- Por exemplo, baixo consumo de frutas e legumes aumenta risco de câncer de cólon.
- Ambiental:
- Radiação, produtos químicos (amianto, tabaco…).
Tipos de câncer
- Carcinoma – aproximadamente 80% desses cânceres estão presentes no tecido epitelial. Porém podemos ter a presença de outros tipos, como os carcinomas epidermóide que podem aparecer em vários órgãos, como por exemplo no esôfago; e há também os adenocarcinomas que podemos encontrar em glândulas como nas mamas (seios).
- Sarcomas – aproximadamente 1% de prevalência e podemos encontrá-los nos músculos, articulações, ossos, tecido de gordura, em vasos sanguíneos, etc.
- Linfomas – se desenvolve no tecido hematopoiético, geralmente localizados nas medulas ósseas vermelhas.
- Leucemia – também é encontrado na medula óssea.
- Melanoma – tipo de câncer que atinge o tecido epitelial, mais especificamente a pele.
Estimativa de incidência de câncer no Brasil para 2016/2017
O quadro abaixo mostra a taxa de incidência estimadas para os homens com os tipos de câncer mais frequentes (exceto pele não melanoma), Brasil e regiões geográficas:
Algo que chama muita atenção e particularmente me preocupa é ver o câncer de próstata como a maior incidência, que na região sul do país chega a quase 96 indivíduo em 100mil habitantes.
Da mesma forma, para as mulheres brasileiras, o quadro traz a incidência para os tipos de câncer mais frequentes (exceto pele não melanoma):
Quando olhamos no geral, ainda é possível ver o câncer de mama como a principal forma da doença em mulheres no nosso país.
Em linhas gerais, é possível perceber que o câncer atualmente merece não só a atenção de médicos e enfermeiros oncologistas, mas de todos os profissionais de Saúde. Diante desses dados, consegue compreender o porquê de eu dizer que, se você ainda não cogitou pesquisar ou trabalhar com pacientes, deveria repensar o caso?
O paciente com câncer
O câncer é uma doença muito temida por todos nós, e não é para menos, pois ainda não temos a cura de todos e é uma doença que interfere em tudo na nossa vida.
É preciso entender que o câncer é uma doença multifatorial que interfere em diferentes aspectos como por exemplo no âmbito profissional, pessoal e financeiro do paciente.
Devemos sempre ter um olhar científico, mas principalmente humanista para conseguir ajudar aos pacientes.
Não é raro encontramos pacientes com um nível de estresse elevado e deprimidos. Sendo assim, é fundamental o trabalho multiprofissional e, principalmente, o diálogo entre os profissionais envolvidos no tratamento.
Bem, pessoal, nesse primeiro post sobre a prescrição de exercício de o câncer, falamos bastante sobre esta patologia: o que é, como surge e quais os tipos de câncer, observamos dados epidemiológicos e começamos a falar do paciente com câncer.
No próximo post nosso foco será as consequências para a saúde do paciente, os resultados deletérios para o aparelho locomotor (principalmente nos músculos), a aplicabilidade dos exercícios em cada fase do tratamento, a prescrição do treino de acordo, além de dicas de como minimizar alguns efeitos da doença em nosso cliente / paciente.
Se você tiver alguma dúvida, ou sugestão, comente aqui no final desse post pois a gente responde no próximo, combinado?
Me despeço por aqui.
Até breve.
Saiba mais
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3 comentários em “Prescrição de exercício e câncer – parte 1”
Muito obrigado professor Rafael Soares! Somou!!
Boa noite, gostaria de aprofundar meus conhecimentos sobre o assunto o senhor teria materiais para me indicar?
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