Esgotados pela crise no setor e cenários duvidosos, muitos arquitetos e urbanistas nos últimos tempos têm se perguntado, o que fazer agora?
Assistimos na semana passada um conjunto de palestras promovidas pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo, sob o título “Qual o Valor do Seu Projeto”. Achamos o tema escolhido muito apropriado, tanto pela necessidade de seu melhor entendimento, quanto pela coincidência de a mesma ter sido organizada na Semana Santa.
Pois este, de fato, e com perdão de trocadilho, é um tema que provoca algum “sofrimento” e também desperta “paixões” entre todos nós, fiéis da Arquitetura, seus praticantes incansáveis e eternos aprendizes.
Não nos surpreendemos com isso. Sempre que escutamos falar de “valor do projeto”, imaginamos essa “caixa preta” que é a remuneração profissional do arquiteto, tentando entender o valor daquilo que produzimos, tanto para nós, quanto para nossos clientes e a sociedade.
Foi a partir daí que nos propusemos a mencionar e comentar um pouco aqui cada um destes critérios e parâmetros, com a intenção de com isso contribuirmos um pouco para o debate acima citado.
Salário e tabela dos honorários
Acreditamos que algum descompasso já começa pelo piso salarial da classe, que corresponde aos 8,5 salários mínimos (para 8 horas diárias trabalhadas), impraticável para escritórios e empresas de arquitetura de pequeno e médio porte. Nem muitos órgãos públicos, aliás, obedecem à risca esta exigência do Sindicato, anotando na carteira de trabalho do profissional qualquer coisa menos arquiteto ou simplesmente, ignorando a carteira por completo.
Mas convenhamos que, estudar tanto e fazer anos de estágio para depois de formado entender que tanto no papel de empregado, quanto no do empregador, participamos da “economia cinza” da sociedade que construímos, o que não nos serve muito de orgulho, como classe.
A verdade é que as duas “modalidades de remuneração” da tabela dos honorários, apresentadas e calculadas como sendo um “percentual sobre o custo da obra” ou “custo do serviço”, oferecidas pelo Conselho da classe (CAU), nos servem mais como vasto material didático, do que propriamente dito como um manual de precificação eficiente, pois a maioria dos profissionais a acha de difícil entendimento ou até impraticável, na maioria dos casos, tanto pela sua complexidade de manuseio, quanto pela aplicação no dia a dia.
Hora trabalhada
Quando perguntamos aos profissionais da área sobre a forma “mais justa” de precificar o próprio trabalho, prevalece, no entanto, uma ideia de “horas”, como um instrumento mais confiável. Do ponto de vista de um profissional, até dá para entender. Mas convenhamos, para aquele a quem apresentamos este conceito, ou seja, para um possível cliente, principalmente se nunca antes trabalhamos com ele, essa metodologia pode parecer um tanto duvidosa.
Num levantamento rápido feito pela internet, percebemos também que a tal hora do trabalho do arquiteto varia, mais ou menos, entre 30 e 300 reais, o que só demonstra a fragilidade deste conceito na prática para leigos. Afinal, o tempo é muito relativo mesmo. Principalmente pelo “resultado” que dois profissionais, de experiências diferentes, obtêm dentro do mesmo intervalo.
Nunca esqueço a dica de um colega que costumava lembrar aqueles que, ainda que brincando, desafiassem remunerá-lo menos, pelo fato dele ter chegado a um resultado satisfatório em tão pouco tempo. Pois aquelas “poucas horas” do trabalho, no entendimento dele, sempre se somavam aos “longos anos” de experiência. Fica a dica!
Porcentagem do custo da construção e do valor geral da venda
A maioria dos profissionais, que mais ativamente participa do mercado de construção civil, tem o entendimento de que a tabela de honorários representa bem o valor do seu trabalho, pelo simples fato do trabalho de arquiteto, de forma intrínseca, ser respaldado no objeto que será construído.
Mas ainda que fosse, acreditamos que esta equação na verdade não beneficia nenhuma das partes. Afinal, do ponto de vista de quem contrata um arquiteto, seu trabalho deveria contribuir para racionalizar o custo da futura obra. O que leva ao famoso paradoxo do “bom arquiteto”, quanto mais barata a obra ele conseguir projetar, menor a sua remuneração?
Para nós, neste caso ainda sobra uma dúvida de ordem não financeira apenas, mas econômica, que é o seguinte: por que atrelar a nossa atividade a ideia de “custo” se a maioria esmagadora não só de arquitetos, mas também dos usuários dos nossos serviços tem o entendimento de que o nosso trabalho, ainda que aos trancos e barrancos, agrega algum “valor” real ao futuro empreendimento?
Que tal a performance?
Esperando com tudo até aqui escrito, ter despertado pelo menos um pouco de curiosidade a respeito. Sugerimos agora pensar em novas e melhores formas de buscar a contrapartida financeira para o trabalho que prestamos.
Ser remunerado pela performance significaria produzir serviços e produtos que geram resultados para toda a cadeia de usuários de nossos serviços. A ideia não é nova, mantendo-se presente em várias profissões similares a nossa. Vejamos os exemplos:
– Advogados: costumam definir o valor dos seus honorários exatamente pela “performance” obtida, definida exatamente como sendo uma porcentagem sobre o valor que conseguem para seus clientes nos processos em que os representam.
– Cirurgiões: não são avaliados, gratificados e respeitados pela velocidade que operam, mas pela qualidade do seu trabalho.
– Corretores de imóveis: atrelam suas comissões como porcentagens relativas ao “valor realizado” que conseguiram na venda de um imóvel.
Apesar de serem profissões distintas, todos estes exemplos mencionados têm algo em comum. Todos, sem exceção, estão resolvendo alguma “dor concreta e fácil de ser mensurada”. Pois nós, também queremos entender qual a dor dos nossos clientes, poder anestesiá-la e se possível, curá-la, prevenindo-os das futuras dores inclusive.
O preço x valor
É do nosso entendimento que o preço, qualquer que seja, e seja como ele for calculado, a gente até pode colocar na mesa e tentar defender, mas que o valor do nosso trabalho, quem outorga ou valida, vai ser sempre o cliente. Só que isso não quer dizer deixar o mesmo à subjetividade de cada um deles. Precisamos poder ter como mensurar o resultado do valor produzido ou agregado pelo nosso trabalho.
Mas para tanto, precisamos poder discutir com clareza e objetividade com os nossos contratantes sobre quais resultados precisam ser atingidos, pois acreditamos que este processo inclusive só trará transparência ao processo de consolidação de valor ao empreendimento como todo.
Enfim, vamos buscar as formas sobre como poderíamos contribuir para além da funcionalidade e estética e se preparar para poder mostrar isso a eles. Essa é única forma de um dia discutirmos em pé de igualdade com os demais atores do processo de construção, a nossa real participação no valor que geram os nossos projetos.
Autor:
[Lattes]