Saiba como o cérebro atua nas preferências alimentares e de atividade física e como é possível ajudar alunos e pacientes a implementar hábitos saudáveis
Adquirir hábitos saudáveis é mais difícil do que parece. Para que profissionais de Educação Física e Nutrição possam realmente ajudar seus alunos/pacientes, é preciso que o processo de adesão a esse estilo de vida seja compreendido.
Existem pessoas que acreditam que a alimentação humana leva somente em consideração o aspecto nutricional e metabólico do alimento consumido.
O comportamento alimentar e os hábitos adquiridos são necessariamente modulados através da interação entre ambientes e sensações emocionais ao longo da existência e convivência social.
Existem áreas cerebrais que são responsáveis por ditar determinados comportamentos a partir da quantidade de estímulos enviados e condicionados no decorrer da vida.
Por exemplo: a parte anterior do lobo frontal, chamada córtex pré-frontal, é responsável pelo planejamento, associação e tomada de decisão a partir de um determinado pensamento ou reflexão. Do ponto de vista psicológico, essa área controla a execução de uma determinada atitude, como, por exemplo, manter a aderência e engajamento em um programa de exercícios físicos ou então a adesão e a continuação de uma dieta.
É essa constante estimulação e processamento cortical que nutre racionalmente o anseio e a vontade de se manter em hábitos saudáveis como dieta ou exercícios físicos, mesmo contra os impulsos e desejos por condutas alimentares prazerosas ou a ociosidade frente a realização de movimentos corporais.
O cérebro e o vício em hábitos prejudiciais
Por outro lado, as vias de prazer que condicionam as lembranças e representações emocionais associadas ao bem-estar provocado por guloseimas ou hábitos alimentares semelhantes são reguladas pelo sistema límbico, mais precisamente na área mesolímbica.
Nela, neurotransmissores como a dopamina e serotonina estimulam sensações de prazer e recompensa advindas dos sinais periféricos relacionados à alimentação e ações físicas. A modulação constante desses sinais cria um limiar excitatório nessas áreas, que condiciona as respostas bioquímicas associativas de prazer e vício frente a uma determinada ação.
Vamos considerar como exemplo o período em que um indivíduo está em dieta: nessa situação, a falta de agentes alimentares viciantes e palatáveis (como açúcares e gorduras) reduz a sinalização de dopamina nessa área e diminui a motivação e recompensa frente a essa nova realidade, condicionando cada vez mais a pessoa a cair em tentação e furar o plano alimentar prescrito pelo nutricionista.
Diante dessa situação, o corpo pede os alimentos que dispararão o aumento da liberação dos neurotransmissores de prazer, principalmente quando o hábito alimentar desse indivíduo condicionou respostas de prazer e felicidade, ao se ingerir fast foods ou alimentos de cafeteria.
Ao consumir esses alimentos gostosos, a liberação de dopamina e serotonina é potencialmente aumentada e a sensação de prazer também segue o mesmo padrão. Entretanto, após essa situação o arrependimento volta a estimular o córtex pré-frontal que, por sua vez, emite sinais que retroalimentam a consciência de que a atitude tomada foi prejudicial ao planejamento e condutas dietéticas estabelecidas pelo nutricionista.
E esse processo acontece de maneira semelhante na dificuldade de aderência ao exercício físico, como já comentamos aqui no Blog nos textos sobre obesidade e sedentarismo.
Como ajudar o cliente/aluno a aderir a hábitos saudáveis
Podemos concluir que, embora a atitude e os desejos sejam estimulados por hábitos e associações que condicionam o nível e limiares excitatórios dos impulsos bioquímicos (sinalizadores das respostas afetivas de prazer), a tomada de decisão e a reflexão acerca das condutas a serem realizadas induzem à tomada de decisões. E elas são, muitas das vezes, as principais responsáveis pela adoção de novos hábitos alimentares. Consequentemente levarão à alimentação saudável e à realização de exercícios físicos regulares, cujos resultados repercutirão diretamente no grau de emagrecimento ou melhora da saúde a partir da adoção dessas práticas saudáveis.
E o mais importante disso tudo é que a adoção desse novo comportamento através de hábitos saudáveis deve ser realizada para o resto da vida.
Diante disso, o planejamento alimentar e prática de exercício físico torna-se um mero coadjuvante. Se a principal peça do quebra-cabeça de qualquer prática saudável não for conquistada, a peça da aderência, de nada adiantarão as estratégias dietéticas e de atividade física.
Não há dúvidas de que o processo cognitivo de reflexão, identificação, entendimento e prática de qualquer intervenção que rompa ou estimule um novo comportamento deve ser trabalhado por um psicólogo. Ou, na ausência dele, que profissionais de Educação Física ou de Nutrição saibam identificar traços psicológicos que sinalizem uma provável não aderência a um programa dietético ou de exercícios físicos.
Referências
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